“Toda relação violenta tem como base uma relação abusiva”, alerta defensora pública
Desde que começou a pandemia, de 1º de abril a 31 de agosto, 2.339 procedimentos foram realizados pela Defensoria Pública Geral do Ceará referentes à violência contra a mulher. “Pouco tempo depois em que estávamos morando juntos, as coisas começaram a mudar”. É assim que começa a história de sucessivas violências de uma mulher assistida da Defensoria Pública do Ceará, que pede para não ser identificada, por questões de segurança. “Primeiro, as agressões verbais, depois, físicas. Mas eu já estava muito dependente”, rememora.
As violências contra a mulher são manifestadas de diversas formas. Podem ser moral, psicológica, física, patrimonial, sexual e de outras naturezas. Um ponto em comum entre todas estas expressões de violência são as consequências profundas na vida da vítima. Para combater e conscientizar a população, foi criado o Dia Nacional de Luta contra a Violência à Mulher, em 10 de outubro, data instituída no ano de 1980.
“O local onde estas mulheres precisam se sentir mais seguras, que é o ambiente doméstico, é onde elas correm risco de vida”, contextualiza a supervisora do Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem), defensora pública Jeritza Braga, referindo-se principalmente ao período de pandemia, em que o isolamento social necessário torna estas vítimas ainda mais vulneráveis. Neste período, muitas mulheres se viram em um isolamento social mais rígido com seus agressores.
“O isolamento tem sido um grande desafio para as mulheres que são vítimas de violência e para nós, que estamos na rede de apoio, também. Muitas não conseguem sair de casa, não consegue contatar ajuda ou acesso a uma rede de apoio”, comenta Jetitza, que reforça que atendimentos continuam de forma remota, mas que para mulheres vítimas de violências podem ser realizados de forma presencial na Defensoria Pública, se agendados.
Em 2018, 4.519 mulheres foram assassinadas no Brasil, de acordo com levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado no Atlas da Violência 2020. O dado representa uma taxa de 4,3 homicídios para cada 100 mil habitantes do sexo feminino. Apesar do número alto, 19 das 27 Unidades Federativas (UFs) brasileiras tiveram redução nas taxas de homicídios de mulheres entre 2017 e 2018. Três estados, contudo, observaram um aumento superior a 20%: Roraima (93%), Ceará (26,4%) e Tocantins (21,4%).
Seguindo uma oportunidade de emprego de seu ex-companheiro e agressor, a atual assistida da Defensoria Pública, à época de seu relacionamento abusivo, mudou-se de cidade. “Lá ele começou a beber cada vez mais, de forma compulsiva, e a usar psicotrópicos. Toda vez que isso acontecia e eu reclamava, era motivo de briga, de empurrão, era motivo de dizer que eu era louca, chata, inconveniente, burra. E eu já estava diagnosticada com depressão, ansiedade e síndrome do pânico”, relata a mulher, que conseguiu romper com o ciclo de violências e pedir ajuda.
Fases da violência – O Instituto Maria da Penha, em seu website, mostra que o ciclo da violência tem três principais fases, de acordo com estudo realizado pela psicóloga norte-americana Lenore Walker: aumento da tensão (em que o agressor mostra-se tenso e irritado por coisas insignificantes, chegando a ter acessos de raiva), ato de violência (explosão do agressor ocorre, e a falta de controle culmina em violência verbal, física, psicológica, moral ou patrimonial) e arrependimento e comportamento carinhoso (agressor se torna amável para conseguir a reconciliação).
Alguns sinais podem ser percebidos quando uma mulher está passando por uma situação de violência, segundo reforça Jeritza. “Esta vítima vai ficando mais introspectiva, menos presente nas relações sociais, muda a forma de se vestir. Uma mulher que é vítima de violência perde tudo, perde a auto-estima, a vaidade, fica em uma vulnerabilidade muito grande”, observa. “Ela se acha culpada e demora a compreender que é vítima de um relacionamento violento. Ele sempre joga a culpa nela. Ela vai ficando cada vez mais vulnerável. E ela se vê muito só, porque nem sempre encontra apoio”, descreve a defensora.
“Quando o homem destrói a autoestima da mulher, quando controla, quando tem sempre o tom de ameaça. Toda relação violenta tem como base uma relação abusiva”, aponta. Romper o silêncio é o único caminho para uma nova vida. Através do Ligue 180, é possível realizar denúncias de violências, fazer reclamações sobre os serviços da rede de atendimento à mulher e receber orientações à vítimas sobre seus direitos e sobre a legislação vigente, encaminhando-as para outros serviços quando for necessário.
Na Defensoria Pública do Estado do Ceará, existe o Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem), em Fortaleza e no Crato, que acolhe essas vítimas. ”Quando o sinal de alerta estiver ligado, busque ajuda para compreender o que está acontecendo. Muitas mulheres sequer sabem o direito que elas têm”, aconselha Jeritza.
Serviço
Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem)
Contatos: (85) 98650-4003 – 8h às 10h40min
(85) 3108-2986 – 10h40 às 13h20min
(85) 99856-6820 – 14h às 16h40min
E-mail: nudem@defensoria.ce.def.br
Atendimento Psicossocial
E-mail: psicossocial@defensoria.ce.def.br
Contatos: (85) 98560-2709 – 8h às 14h
(85) 98948-9876 – 11h às 17h
Atendimento Psicossocial Cariri
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Telefone: (88) 9 9934-8564 – 8h às 14h / (88) 9 9680-8667 – 8h às 14h / (88) 98842-0757 – 11h às 17h


