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Defensoria entrega aos indígenas novas certidões de nascimento com nome da etnia jenipapo kanindé. Ação tem parceria com Sepince e TJCE

Defensoria entrega aos indígenas novas certidões de nascimento com nome da etnia jenipapo kanindé. Ação tem parceria com Sepince e TJCE

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Momento histórico é quando o Estado brasileiro reconhece a existência (e resistência) dos povos indígenas em seus milhares de anos de história e lutas. O momento é ainda mais emoção quando esse reconhecimento se dá dentro do território sagrado deles e também no papel. A entrega das primeiras certidões de nascimento de povos indígenas do Ceará que constam a sua etnia aconteceu nesta terça (14) na Lagoa Encantada, em Aquiraz. A aldeia  jenipapo kanindé foi a primeira beneficiada com o projeto Povos do Siará e inaugurou mais uma política pública de afirmação indígena no Estado.

Das mãos de defensoras públicas e parceiros, as pessoas de todas as idades, mas em maioria  crianças, receberam as novas certidões, o papel que traz novos direitos. Tava bem animada a matriarca, Cacique Pequena, ao ver a movimentação da devolutiva do projeto que, após um ano, retornou ao povoado com as primeiras 27 novas certidões de nascimento: as primeiras pessoas do Estado do Ceará a ter no papel o nome da etnia na qual pertencem. “Nós tivemos essa benção de alcançar isso, tanto desejo que a gente tinha e a gente conseguiu. Hoje choro de alegria por tudo que estou recebendo e também pela demarcação do nosso território, uma alegria vinda de tanta luta, desde 1980. A Cacique Pequena deu sua vida, seu suor por este povo tão adormecido que existia aqui neste lugar e nem tinha entendimento de nada. Senti na pele que este povo precisava e foi aí que comecei a luta e estou aqui para contar”, disse emocionada. Ela mesma não recebeu sua certidão, que restou perdida na burocracia, mas já está assegurada com o pedido da Defensoria em um processo de lavratura de um novo registro à Justiça, feita pelo Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas. 

A ação teve parceria com o Tribunal de Justiça do Estado (TJCE), por intermédio da Corregedoria-Geral, e a Secretaria dos Povos Indígenas (Sepince). Assim, estiveram presentes a defensora geral, Sâmia Farias, o juiz auxiliar da Corregedoria do TJCE, Gúcio Coelho Carvalho e a secretária estadual da temática, Juliana Alves, Cacique Irê, que foi a primeira a receber a nova certidão com o registro de sua etnia. Ela agradeceu e enalteceu a iniciativa que, segundo ela, “significa um reconhecimento do próprio Estado. Significa ver que as nossas futuras gerações já terão essa garantia desse direito que um dia foi negado. Então a nossa luta é constante para ter nossos direitos garantidos e não mais violados. Que as nossas futuras gerações possam dar continuidade à essa história de luta e de vida de tantas e tantas lideranças que lutaram para que hoje as comunidades pudessem estar alcançando as políticas públicas de Estado”, disse.

A defensora geral Sâmia Farias falou da alegria de repetir este momento. “A  Cacique Pequena nos lembrou aqui da luta das mulheres indígenas e de tantos que, como ela, batalham pelo fortalecimento dos direitos e da dignidade das comunidades indígenas do Ceará. Daí nossa alegria e retornar aqui, neste território que é sagrado, para dizer a vocês que começamos a alcançar essa esperança para que nunca mais se diga que o Ceará não tem povos indígenas. Basta ver na certidão de nascimento deles que sim, eles existem e são importantes para nós”, afirmou Sâmia Farias.

Estiveram ainda presentes as defensoras Mariana Lobo (supervisora do NDHAC) e Lia Felismino (assessora da relacionamento institucional) e a ouvidora Joyce Ramos, o secretário executivo estadual da pasta de Diretos Humanos, Jovanil Oliveira que ainda ouviram as crianças do Canto Livre Nheengari Sambokar. Em uma fala emocionada, a ouvidora Joyce Ramos lembrou sua origem quilombola, da serra do Evaristo, em Baturité, e de todos os povos tradicionais do Ceará em suas lutas por direitos. “Que a gente possa ter muito mais ações como essa e destacar a luta de grandes mulheres, mulheres guerreiras que assumem a luta e o compromisso para com seu povo. Em nome da Defensoria do Ceará, destaco a trajetória da Cacique Pequena, uma inspiração para todas nós”. 

A entrega das certidões aos jenipapo kanindé também integrou a Semana do Registro Civil. “Qual a grande demanda dos povos originários? É justamente a averbação da sua etnia na certidão de nascimento, isso que confere essa identidade e a sensação de pertencimento.Então esse é o trabalho que a gente tá fazendo aqui, em parceria com a Defensoria, neste lugar tão bonito e em uma campanha tão importante para este povo”, disse o juiz auxiliar da corregedoria Gucio Carvalho. 

“Como esse tipo de mudança na certidão só é feita no Ceará após ordem da Justiça, o trabalho da Defensoria precisou ser meticuloso ao ponto de nos remontarmos a árvore genealógica de cada pessoa. E, em alguns casos, isso demandou um trabalho maior de investigação e escuta. Porque, no fim das contas, nós estamos falando aqui de respeito à identidade, por óbvio, mas também de algo fundamental aos povos indígenas, que é a ancestralidade”, explicou a supervisora do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC), defensora Mariana Lobo. Ela destaca que está programando ainda para 2024 uma segunda edição.