
Mônica Silva: “Agora sou no papel o que sempre fui”
Texto: Déborah Duarte
Foto: ZeRosa Filho
“Eu sei que eu sou uma joia porque eu sei
o quanto precisei me lapidar pra chegar até aqui.”
Liniker (@linikeroficial)
A trajetória de Mônica de Sousa Silva não foi fácil. Nascida em um corpo masculino, ela foi adotada por dona Francisca com apenas 12 dias de vida. Desde então, a relação das duas se fortaleceu em um laço de amor e cumplicidade. “Minha mãe sempre me apoiou. Ela é minha inspiração; minha companhia. Aonde eu vou, levo minha mãe. Ela é a minha menina e eu sou a menina dela”, resume a mulher, com um sorriso de gratidão.
No último dia 25 de junho, as duas estavam na sede da Defensoria Pública do Ceará (DPCE) para mais um momento de superação. Mônica recebeu a nova certidão de nascimento com a mudança de nome e gênero para os quais se identifica. Ela e outras 197 pessoas estão recomeçando um novo momento na vida por meio do Transforma, o mutirão da instituição que altera a certidão de forma gratuita para as pessoas trans e travestis.
De certa forma, isso une as duas. Dias antes de Mônica receber a nova certidão, foi a mãe, de 87 anos, que também teve acesso à cidadania. Com o tempo, o documento estava desgastado e rasurado, e a idosa não conseguia emitir a segunda via do RG porque a certidão de nascimento era muito antiga. “Ela perdeu o RG e a gente não conseguiu tirar outro documento porque a certidão de nascimento era no papel bem fininho. Fomos na Defensoria também para pedir essa segunda via. Assim que recebemos, fomos emitir o RG. Ela já vai receber também. Estamos as duas com novas certidões”, explicou Mônica.
Mônica, que desde os 12 anos se reconhece como mulher, descobriu a possibilidade de fazer a retificação através de uma matéria na televisão. “Eu não sabia que isso era possível. E foi tão rápido! Consegui, graças a Deus, e agora sou no papel o que sempre fui: a Mônica”, afirma, emocionada.
Aos 37 anos, ela conta que enfrentou preconceitos. E a ausência de apoio da mãe biológica, vê na retificação uma nova oportunidade de vida. “Hoje renasci e amanhã é o dia da minha mãe. Me sinto uma guerreira e agora é continuar batalhando pelos meus sonhos”, afirmou.
Determinada a melhorar de vida, Mônica planeja voltar a estudar e crescer profissionalmente, sempre seguindo os conselhos de dona Francisca. “Meu sonho é ajudar minha mãe e crescer na vida. Só tenho a agradecer”, completou.
A história de Mônica e dona Francisca é exemplo de superação e amor incondicional, mostrando que o apoio familiar pode transformar vidas e realizar sonhos, mesmo diante das adversidades.
A psicóloga Andreya Arruda, coordenadora do psicossocial destaca a importância do apoio, acolhimento familiar e respeito. “Esses princípios são imprescindíveis para a liberdade da pessoa ser quem ela quiser, uma vez que a empatia e a compreensão da diversidade muitas vezes podem funcionar como refúgio e abrigo, sendo o lar e um ambiente mais seguro. Por isso, o respeito à identidade de gênero no seio familiar é essencial, uma vez que o processo de afirmação de gênero abrange questões diversas que já serão desafiadoras no contexto social. É muito importante sentir esse apoio e a implicação de toda a família nesse processo de busca da afirmação da própria identidade. O caso de Dona Francisca e Mônica para além de um recado, é um exemplo lindo de que o que mais importa é o amor e o respeito”.
Os olhos de dona Francisca não negavam o orgulho e a admiração. “Ela é o amor da minha vida. Hoje é a realização do sonho da minha filha. Se ela está feliz , eu estou muito mais”, declarou uma orgulhosa dona Francisca.