Entre desafios e conquistas, Antônia Araújo faz balanço de mandato à frente da Ouvidoria da Defensoria Ceará
“Gerir o espaço da Ouvidoria em um momento de pandemia é olhar o papel da Defensoria Pública pensando, principalmente, nas pessoas vulneráveis”. É assim que Antônia Mendes Araújo observa o trabalho realizado como ouvidora-externa da Defensoria, cargo que ocupou desde agosto de 2019 em ciclo que será encerrado no próximo domingo, dia 29. Antônia pontua que um dos avanços que sua gestão conseguiu executar foi ampliar os territórios de atuação, como Crateús, Quiterianópolis, Ipaporanga, Brejo Santo, Barbalha, Nova Olinda e Altaneira.
A Ouvidoria Geral da Defensoria Pública do Ceará foi instituída em 2010 e é ocupada por um membro da sociedade civil, eleito por seus pares e escolhido pelo Conselho Superior da Defensoria (Consup), que tem o objetivo de ser o elo entre a população assistida, os movimentos sociais e a instituição. Antônia foi a quarta ouvidora, antecedida por Ana Virgínia Ferreira Carmo e Merilane Pires Coelho. Antônia será sucedida por Francisco Alysson da Silva Frota.
O trabalho de Antônia pode ser traduzido em números, somando 7.352 atendimentos, sendo 3.744 no primeiro trimestre de 2021. Do número geral, 67% das manifestações foram abertas por mulheres e 32%, por homens. Por meio de WhatsApp, e-mail e telefone foram 2.639 atendimentos.
Um dos desafios encontrados nestes dois anos, ela aponta, foi alcançar as pessoas vulneráveis digitais no momento de isolamento social mais rígido, devido à pandemia de coronavírus (Covid-19). Pessoas vulneráveis digitais são aquelas que não têm acesso ou não sabem usar a internet e o telefone, como pessoas idosas e população em situação de rua.
“Conseguirmos pensar, junto à gestão da Defensoria Geral, para viabilizar os atendimentos dos vulneráveis digitais. Acredito que nossa atuação foi muito positiva. Quando começou a pandemia, a gente passou a perceber que as pessoas se distanciaram mais dos atendimentos, principalmente a população de rua. Mesmo sabendo dos riscos, não deixamos a Defensoria fechada, para garantir que estas pessoas conseguissem atendimento, só que foi aumentando, e a gente foi recomendado à gestão, apontando falhas para garantir os agendamentos. E garantimos”, resume.
Participação social na instituição – Durante o Ciclo do Orçamento Participativo, a sociedade civil organizada, os movimentos sociais, a população em geral, além de defensoras e defensores, podem se manifestar sobre demandas de suas cidades e comunidades durante as audiências, que são conduzidas pela pessoa que ocupa o cargo de ouvidor da Defensoria. Neste ano de 2021, com evento todo realizado de forma virtual, foram registradas cerca de 1.000 participações, um volume expressivo. Este foi o primeiro ciclo do Orçamento Participativo institucionalizado como política pública.
Criado em 2016 de forma inédita no sistema de justiça cearense, o Orçamento Participativo (OP) da Defensoria Pública passou a ser política institucional regulamentada por lei e deve ter realização anual obrigatória. No dia 11 de março de 2021, a Assembleia Legislativa do Ceará (Alce) aprovou projeto encaminhado pela defensora geral Elizabeth Chagas no qual o Orçamento Participativo passou a ser uma ferramenta obrigatória na composição do orçamento da instituição.
Antônia considera uma das importantes conquistas durante seu mandato. “O Orçamento Participativo é uma conquista dos movimentos sociais dentro da Defensoria e precisa ser visto como algo que fortalece a instituição, em um modelo de gestão que se espera das instituições públicas. É um legado fruto da mobilização da população”, celebra.
Outra conquista foi a luta por uma nova base do teto de gastos para a Defensoria Pública do Ceará também teve contribuição da Ouvidoria, segundo ressalta. Foi a PEC 06/20, enviada pelo Governador do Estado do Ceará, Camilo Santana, visando alterar a base do teto de gastos, instituída em 2016 pela Emenda Constitucional n.88, que impôs o novo Regime Fiscal no âmbito do orçamento fiscal do Estado. A tramitação em regime de urgência da PEC foi aprovada em novembro de 2020, ampliando possibilidades orçamentárias para a instituição.
Para a população em cárcere, uma militância aproximada com mães e mulheres do sistema prisional, o que resultou também na construção do protocolo e do formulário que visam o combate à tortura e outras violências, lançado pela Defensoria em abril de 2021, teve participação da Ouvidoria. O formato foi elaborado para defensores e defensoras cearenses conseguirem identificar e registrar com mais facilidade casos de agressão, abuso, tortura, violência psicológica ou outro tratamento cruel – e, assim, fazerem os encaminhamentos necessários a cada tipo de ocorrência. “Foram feitas observações do ponto de vista de gênero e de raça, que foi sugestão da Ouvidoria, na tentativa de identificar situações que remetam ao racismo e à violência de gênero nas audiências de custódia”, reforça Antônia.
Por fim, e no menos fundamental, Antônia pontua a lei que criou as cotas para populações índigenas, negras, negros e quilombolas. Primeiramente criada como uma Instrução Normativa (nº 82/2020), que foi ampliada como marco legal para todos os concursos e seleções da instituição. “Essa é a luta dos movimentos sociais, uma busca por amplificar a diversidade na Defensoria. Desde o primeiro momento em que sugeri para a gestão, tive a demanda acolhida. E agora é lei”, enfatiza.
Sem clima de despedida, porque os braços são feitos de afetos e a luta segue, Antônia ressalta que “a Ouvidoria é um espaço muito próprio da sociedade civil. É uma conquista importante, que olha para as demandas das populações mais vulneráveis. Fico satisfeita com este período que passei à frente da Ouvidoria, contribuindo e construindo junto”, celebra Antônia.


