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Especial Pop Rua: “O pobre não vive, ele sobrevive. Hoje, minha companheira é a solidão”

Especial Pop Rua: “O pobre não vive, ele sobrevive. Hoje, minha companheira é a solidão”

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Texto: Déborah Duarte
FOTOS: ZE ROSA FILHO  /  Ilustração: Diogo Braga

Todos os meses, a Defensoria Pública do Estado do Ceará leva a Van de Direitos para alguns dos equipamentos especializados no atendimento à população em situação de rua, em Fortaleza. Em cada local, uma média de 50 pessoas são atendidas, número que muda a cada edição, a depender dos horários que acontecem os atendimentos. Mas há uma certeza que acompanha a equipe técnica em todos os encontros: a demanda só aumenta, ou seja, o número de pessoas em situação de rua é uma linha ascendente

Segundo levantamento do Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua, da Universidade Federal de Minas Gerais (Polos-UFMG), com base em dados do Cadastro Único (CadÚnico), revelou que o número de pessoas em situação de rua cresce desde 2012. Naquele ano, todo o Estado do Ceará tinha 610 pessoas vivendo nas ruas. Já em 2021, nove anos depois, esse número subiu para 6.114, representando um aumento de 902%. Em Fortaleza, o número saiu de 548, em 2012, para 4.182, em 2021. Totalizando um aumento de 663%. Hoje estima-se que haja 8 mil pessoas nesta condição em Fortaleza, a quinta cidade que possui a maior população de rua no país. 

Não à toa, a capital cearense está entre as 59 cidades da lista prioritária divulgada pelo governo federal para receberem apoio técnico no combate à fome e na promoção de alimentação saudável. A estratégia “Alimenta Cidades”  foi definida pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e publicada em uma portaria no Diário Oficial da União  no dia 27 de março deste ano, incluindo uma segunda cidade cearense: Caucaia, com 464 pessoas vivendo nas ruas.

É o caso de José. O jovem chegou a morar com o  irmão em Recife, mas não se acostumou e quando voltou para Fortaleza, teve que morar nas ruas. “Ele era muito autoritário e voltei, porque um pássaro nasceu pra ser livre. E foi o destino que me colocou aqui na rua. Minha casa é aqui, é a praça, a calçada, a praia. Hoje eu sei que sou um mendigo, eu me sinto um mendigo, mas é a mendicância que me faz sobreviver. Aqui eu me sinto bem, porque é a minha história de vida, né? Mas eu quero muito trabalhar, arranjar uma ocupação, ocupar a minha mente, sair dessa situação, porque o pobre não vive, ele sobrevive. Hoje, minha companheira é a solidão”.  

A defensora pública Camila Vieira, assessora de projetos da Defensoria, esteve à frente da organização do atendimento no dia 19 de maio na Praça do Ferreira e ressalta a necessidade de entender as reais demandas desta população. “A Defensoria dialoga com a sociedade civil, com os órgãos e os equipamentos que prestam atendimento à população em situação de rua para chegar ainda mais próximo de suas necessidades e entender quais direitos estão sendo violados. Fazemos um atendimento especializado, tanto no campo jurídico como no psicossocial, in loco, atendendo essa população nos espaços em que ela já está, saindo dos gabinetes para estar perto dela. É uma população que muitas vezes é invisibilizada no seu direito e que precisa de políticas públicas e atenção da sociedade”, ressalta.

Ela destaca que as principais demandas são por documentação pessoal, como acesso à certidão de nascimento, acesso à políticas de alimentação básica, acesso à política habitacional, às políticas de saúde, inclusive a rede de saúde mental. “É preciso olhar para essa população e trabalhar de forma articulada com sociedade civil e Poder Público para garantir os seus direitos e uma vida com mais dignidade, sendo imprescindível a criação e ampliação de políticas públicas voltadas a esse público alvo. É urgente a atenção à garantia do direito à moradia e ao direito à saúde, tanto na perspectiva da atenção à saúde mental quanto de políticas sobre drogas, com a criação e a ampliação de equipamentos e de políticas públicas voltados ao esse atendimento”, revela.

Em Fortaleza, a atuação para esta seara se fortalece  com os movimentos de luta e do apoio da sociedade civil organizada para construção de uma sociedade mais democrática. O Grupo Espírita Casa da Sopa é uma dessas entidades. Fundada em 1995, atua no campo da assistência social e na metodologia do tratamento comunitário. “A gente tem diversos projetos funcionando. Temos espaço para banho, oferecemos refeições. Damos aula com base no método de Paulo Freire, ajudamos mulheres, tudo na base do voluntariado e doações. Parcerias como essas com a Defensoria Pública nos fortalece e nos ajudam a atender as pessoas em outras dimensões, porque para eles tudo é muito difícil”, lembra Isabel Fernandes, uma das colaboradoras da Casa.

 

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