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#NaPausa discute projeto jurídico feminista brasileiro

#NaPausa discute projeto jurídico feminista brasileiro

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O #NaPausa, programa de conversas e debates ao vivo da Defensoria Pública do Estado (DPCE), pautou na última sexta-feira (8/9) o projeto jurídico feminista brasileiro. Discutiram o tema a defensora pública Liana Lisboa e a mestre em Direito e doutora em Psicologia Fabiana Severi.

Com 14 anos de vigência completados no último dia 7 de agosto, a Lei Maria da Penha foi apontada como “um grande marco da militância feminista”. “É um divisor de águas na tentativa de assegurar, a nível normativo e de vivência empírica, a integridade de mulheres”, afirmou a defensora.

Liana Lisboa afirmou que “a centralidade da lei não é de agora” e alertou que são diversas as frentes de atuação que lidam com Direito e feminismo no Brasil. E ponderou: “a estratégia do movimento feminista de instrumentalizar o Direito me parece uma crítica que só se retroalimenta. Anos depois, a gente está repetindo a mesma narrativa. Isso é aflitivo.”

O papel das defensorias públicas foi enaltecido tanto no Sistema de Justiça brasileiro quanto no desenho das políticas de enfrentamento às violências contra as mulheres, sobretudo a doméstica. Fabiana Severi, no entanto, alertou que “a popularidade da Lei Maria da Penha está muito associada a uma visão que destaca sempre aspectos penais.”

Conforme ela, não é possível falar da lei pelo referencial penal-punitivo, pois a prisão dos acusados é residual. A pesquisadora enalteceu que a ideia de uma resposta estatal às violências vem sendo costurada pelo movimento de mulheres e pelo movimento feminista há pelo menos 30 anos. E não apenas no Brasil. A articulação deu-se na América Latina.

“A violência aparece como uma conta dentro de um processo histórico de luta por direitos. Era necessário um paradigma de enfrentamento à violência que garantisse direitos às mulheres. Já nos anos 90 a discussão estava dentro desse campo. E foi um dos temas mais tensos para decidir se iria dialogar com um tipo penal ou não, porque as consequências do Direito Penal sempre existem. Há, então, um paradigma antipunitivista no sentido de como nosso sistema penal tem funcionado. Se centra muito no agressor e não na pessoa vítima de violência”, frisou Fabiana Severi.

Para a estudiosa, o projeto jurídico feminista brasileiro é uma luta coletiva para garantir que mulheres sejam reconhecidas como sujeitos de direitos. Algo associado a um projeto de justiça social e de radicalização da democracia, exatamente o contexto no qual foi pensada a Lei Maria da Penha – que fala na necessidade de existir uma “rede de serviços” para a mulher em situação de vulnerabilidade.

“A porta de entrada não necessariamente deveria ser o BO [Boletim de Ocorrência], o sistema de justiça ou a segurança pública. A lei fala em atender as mulheres e as suas demandas sobretudo na garantia de direitos. Muitas vezes, o que as mulheres querem pra sair de uma situação de violência são direitos. E a resposta penal é só um caminho. Mas foi convertido no principal ou no único caminho. O Judiciário implementou a lei no viés mais reducionista. Cadê o juizado híbrido? Quantos estados e comarcas olham as questões cíveis junto das questões criminais? A resposta tem que ser dada em rede”, sublinhou Fabiana.

A mestre em Direito destacou que o campo feminista é plural e tenso, e disse ser muito importante os brasileiros conhecerem as próprias feministas. Hoje, conforme ela, o movimento feminista é mais notabilizado pelo que dizem lideranças internacionais. “A percepção do direito é um campo ambíguo. Mas não vai dar pra mudar a sociedade não passando pelo Direito. E o Direito carrega uma narrativa de utopia, que tem um quê libertário quando diz que todos somos iguais. O que a gente vê nos movimentos sociais é a luta de tornar isso realidade. E a Defensoria é quem está ali, ajudando e, muitas vezes, é quem vai definir a qualidade da porta de entrada dos casos no Sistema de Justiça”, finalizou a convidada.

O #NaPausa é um projeto fruto de parceria da Escola Superior da Defensoria Pública (ESDP) com a Associação dos Defensores Públicos do Ceará (Adpec). Durante todo o período de isolamento social, mais de 30 mil pessoas já foram alcançadas pelas lives, cujos temas são sempre de interesse público. A iniciativa visa aproximar ainda mais a população da DPCE através do uso das novas tecnologias e plataformas de comunicação.